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quinta-feira, 20 de junho de 2013

A PANELA DE PRESSÃO EM JUNHO DE 2013

Hilário Dick
Falávamos e falamos de Maio de 1968. Um Maio memorável, misterioso, difícil de entender. Passaram-se 45 anos e não conseguimos entende-lo, ainda, e não estamos entendendo, de novo, um junho de 2013. Esta juventude! O motivo mais concreto é o aumento das passagens de ônibus: as pessoas têm o direito e a necessidade de locomover-se, mas os donos estão cobrando demais, lucrando demais em cima das necessidades do povo e, de modo especial, do estudante que se deve locomover em busca de sua profissão, de sua sabedoria, da sua convivência com os/as outros/as num espaço que se chama “escola” ou “universidade”, direito de todos.

O que seriam estas movimentações todas, bonitas, pacíficas, cheias de insatisfações, que certa parte do sistema só sabe definir como “depredação” e “violência”? A gente parece que não se deu conta que a panela de pressão arrebentou... É feijão no teto, nas paredes, em todo lado. O problema está em saber quem deixou a panela de pressão arrebentar. E as ruas do Brasil viraram uma cozinha enorme com cheiro de feijão que não se aguentou mais na panela. De quem é a culpa?

Não sejamos cegos dizendo que as multidões que há tempo ou nunca foram às ruas não tenham motivações em suas cabeças, bolsas, bocas e cartazes. Se falarem, vai ser uma “explosão” de raivas, de sonhos pisados, de “bastas”, de indignações ao mesmo tempo claras e indefinidas. É feijão por todo o lado... E quando o povo vai à rua que não é bem para cantar e dançar inocências ou safadezas, os escudos, os guinchos de água e os cassetetes se vão ajeitando às claras e às escondidas, comandados por quem só gosta de massa e não de povo. Naquela hora deixam de haver inocentes e culpados. Todos são culpados...

Impossível dizer as razões destas multidões nas ruas, contudo há aspectos que devem ser tomados em conta:

1.      A manipulação

Há muitos meios de fazer que sejamos manipulados. Parece que estamos na sociedade da Manipulação. O que manda é a aparência: somos o que aparentamos. Para isso existe a moda, o consumo, tantas coisas que os diferentes Meios de Comunicação fazem para que sejamos como eles dizem que deveríamos ser. Nem vale o sexo; o que vale é o corpo. O outro não existe; a utopia está no meu umbigo. Se conseguimos conquistar tantos direitos, onde está a grandeza da pessoa humana? A utopia não é “social”, mas corpórea. Até na religião vale a aparência. É só dar uma olhada nos costumes “clericais” e dos próprios “conventos”. O que vale é a aparência; os grandes eventos... As Jornadas Mundiais de Juventude não estão fora desse enquadramento da aparência e da manipulação. Manipula-se a própria realidade. Fica sempre mais claro que as técnicas da comunicação nos apresentam uma realidade que não é a realidade.

Em vista disso e de outros aspectos fala-se de mudança de paradigmas. Tudo evolui de tal jeito que não se sabe mais o que é “Estado”, o que é “Família”, o que é “Escola”, o que é “Igreja”, o que é “Coletividade”, o que é “Solidariedade”... E a panela de pressão explode. Nunca tivemos uma juventude tão manipulada como hoje. Demora ela dar-se conta, mas quando acorda vemos o feijão voando para todos os lados.

2.      Corrupção

As técnicas de comunicação e controle são tantas e tão sofisticadas  que fica sempre mais claro que a corrupção está sendo descoberta como parte ontológica da pessoa e da sociedade. Estamos muito além dos “mensalões” que para a elite farisaica e sarcástica parecia o começo dos enganos e dos abusos do dinheiro do público. Quando se começa a levantar o tapete de tudo que é roubalheira em todos os sentidos, proíbe-se o Ministério Público investigar. A corrupção é econômica, é política, é moral, é religiosa; a corrupção parece correr nas veias da sociedade. Mesmo que já soubéssemos, como foi ruim virem à tona as corrupções  de um lugar sagrado como é o Vaticano! E não nos enganemos, pensando que não haja outros muitos Vaticanos.

No auge da corrupção do poder romano, o que valia para conservar a paz no Império, era o “pão” e o “circo”. O que significa haver bilhões de reais à disposição para construir “circos” para o povo, quando se diz que não há dinheiro para a saúde, a educação, o transporte, o lazer etc?  Vendo tudo isso, a panela de pressão não aguenta mais. Contemplando esta realidade e pensando em algo específico como a Jornada Mundial da Juventude, não haveria nada em comum? Investimento em marketing; em vez de “cuidado”, o “controle”; em vez de “processo”, o poder manipulatório de eventos; movimentos de massa abusando do valor religioso e popular de alguns símbolos, falando de um “Bote Fé” superficial e festeiro... A panela tem que explodir.

3.      Saturação

Estamos num mundo “saturado”. Não tem mais lugar para o “eu”;  melhor o “eu” está tão grande que não cabe mais... Tudo é objeto. A encarnação mais descarada disso são os “shoppings” que, além de saturarem as vistas, os desejos, as bolsas, carregam no seu bojo algo que não se gosta de dizer: a força da exclusão. Tudo vem de cima; tudo vem feito. Tudo bonito, perfeito; tudo a ser feito e a ser consumido. Desde os objetos, até a educação, as decisões, as religiões. Nas religiões, por exemplo, valem os “catecismos”. Eis aí a solução para as inseguranças! Ao mesmo tempo, a grande fome que está nas ruas é o “protagonismo” e a “autonomia”. De jovens e menos jovens; na sociedade e nas igrejas, nos pátios e nas salas de aula; nos encontros religiosos e “profanos” o que se vai conquistando e o que vai provocando medos e terrores é a autonomia e o empoderamento. Também dentro das igrejas. Parece que o desafio da criatividade desapareceu. Não há lugar para as preciosas pequenas invenções.

Estamos vivendo num mundo “impregnado”. Vivemos numa sociedade “cheia”, “farta”, “saciada”, “ocupada”. Não há mais lugar nem para a poesia ou a confissão de bonitas ignorâncias. Somos “informados” de tudo. Até parece que sabemos de tudo... Não há ilha que escape. Por outro lado, estamos saturados de enganos, de engodos, de mentiras, de desonestidades, de desconfianças. “Confiar em quem?” Por ora, é a família que mais inspira confiança, mas os tipos de famílias se misturam e aumentam em belezas e excentricidades. Enfim, a panela do feijão vai explodindo...

4.      Desrespeito

Outro motivo da explosão da panela é o desrespeito. As pesquisas mostram que o “desrespeito” é uma das fontes da violência dos jovens, quando ela surge da juventude.  Os jovens não são violentos porque querem, mas porque foram violentados... Um dos motivos sérios da explosão da panela de pressão é o desrespeito que toma muitos aspectos: a construção de hidro-elétricas; a questão das reservas de terras para os indígenas; o transporte público; a redução da maioridade penal; o PEC em debate; a falta de cuidado com os jovens nos espaços de lazer; o desemprego; a questão das cotas na Universidade e 39 coisas a mais. Quem não se dá conta de que há eventos horripilantes, junto à periferia dos grandes centros (Goiânia, São José os Campos, São Paulo, aqui e acolá) que provam que há “mistérios” que pensam e fazem como que os pobres não deveriam existir? Veja-se a forma como se olha para a mulher; o significado das marchas das “vadias”, enfim o desrespeito em muitos aspectos, sem falar do Direito, da Polícia, das diferenças de ricos e pobres. Assim como não se respeita a criança, não se respeita nem o jovem nem o idoso... Seria preciso falar do Extermínio de Jovens? Das injustiças entre brancos e negros? De centros e periferias? De lucros exorbitantes? O desrespeito dói e ajuda a panela a ela arrebentar.

São pequenas pobrezas que ocorrem dizer vendo tudo que significa assistir a panela de feijão explodindo na cozinha. Fiquemos desejando que todas estas “marchas” signifiquem, mais adiante, organização. Aí, sim, todas as panelas vão se libertar de seus jugos internos

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