Um apelo à CRB do Rio Grande do Sul e do Brasil
fazendo memória do P. Gisley Azevedo - estigmatino
Gostaríamos tanto de falar de tudo que os/as religiosos/as já fizeram e fazem pela juventude, no Brasil e na América Latina, mas agora precisamos falar outras coisas porque não é hora de ficar calado. Escrevemos depois de saber do 7º padre morto, no ano de 2010, por causa da juventude e, dentre eles, o P. Gisley Azevedo , o único religioso entre os sete e que foi assassinado com três tiros na cabeça, em Brazlândia. Nossa indignação e nossa reflexão se orientam, de modo especial, para os que fazem parte da Vida Religiosa e vamos ater-nos a quatro aspectos. Sabemos que não são palavras fáceis nem agradáveis. Mesmo que a resposta seja o silêncio, leia quem quiser ler e discuta quem quiser discutir e melhorar a situação.
1. ESCÂNDALO OU COVARDIA DOS RELIGIOSOS?
Os 30 anos do IPJ, com sede, primeiramente, em Porto Alegre e, depois, no bairro Niterói, em Canoas/RS, vão ser festejados com um triste fechar de portas, pelas mesmas Congregações que, um dia, se alegraram com o seu nascimento. Muito triste porque os 30 anos, de tantos serviços à juventude, parecem ter-se tornado uma memória que precisa ser esquecida. Cria-se um filho para matá-lo depois. Assim como aconteceu com a Ação Católica e quase está acontecendo com a Pastoral da Juventude.
A dúvida é se isso (o fechamento do IPJ/RS) é um escândalo ou se é uma covardia. Desde seu início, em 18 de janeiro de 1980, o IPJ foi um serviço dos religiosos do Sul 3 à Igreja do Rio Grande do Sul para a evangelização da juventude. Comandavam-no três objetivos: formação, assessoria e pesquisa. Quantos cursos, seminários e retiros; quantas viagens pelas dioceses; quantas publicações, servindo de alimento para adultos e jovens; quanta alegria e quanta descoberta! Até no campo da pesquisa e da produção, como se trabalhou... Era um serviço de uma inter-congregacionalidade visitado e admirado por vários/as Superiores/as Gerais, pondo-se a serviço da evangelização da juventude. Mesmo com algumas dificuldades, funcionou durante 30 anos. O que aconteceu? Se o IPJ perdeu sua atualidade, saber-se-ia dizer alguma razão ou é, tristemente, a mudança de um cenário de Igreja? Falta de recursos financeiros? Falta de recursos humanos? Se a resposta for financeira, é um escândalo porque todos sabem que isso não é verdade e todos sabem que trabalhar com jovens nunca deu lucro; se a resposta for falta de recursos humanos é uma covardia descarada porque todos sabem que existem agentes (leigos e religiosos), preparados, com vontade doida de dedicar-se a este serviço, com uma remuneração digna. Se a motivação é ideológica ou de cenário de Igreja, a covardia e o escândalo se tornam mais sérios porque isso não se confessa. Isso se faz, mesmo que na surdina.
Se lermos o documento 85 da CNBB – Evangelização da Juventude – Desafios e Perspectivas Pastorais, vamos descobrir que, fora aquilo que se refere ao “Setor”, lá se encontra formalizado o que o IPJ/RS, em comunhão com a Igreja e a Pastoral da Juventude da América Latina, sempre defendia. Além dos variados serviços prestados, não foi com a ajuda do IPJ que também se iniciou, no Brasil, o primeiro dos Cursos de Pós-Graduação em Juventude, fazendo que a juventude se tornasse um assunto encarado com mais cientificidade? Mais ainda: um dos objetivos do IPJ não era exatamente o estudo e a pesquisa da realidade juvenil? Há, contudo, religiosos/as que afirmam que um IPJ não precisa de pesquisa... Motivo de escândalo e de covardia é uma Conferência de Religiosos, ou uma parte dela, confessar que não está em condições de manter viva uma obra com os objetivos do IPJ/RS. O que parece ter acontecido é que terminou nela, numa parte da Vida Religiosa, o encanto pela juventude... Não falamos da juventude que está sob as asas das Congregações, principalmente em seus colégios; falamos dos milhares de grupos de jovens espalhados pelas paróquias e dioceses que não podem contar com o apoio das famílias de religiosos/as que dizem ter, como carisma, o trabalho com a juventude. Não ter olhos para esta realidade é escândalo e covardia. E é por aí que o IPJ prestava seu serviço nem sempre acolhido por autoridades, mas sempre agradecido pelos jovens, isto é, pelas juventudes vivendo sob as asas das paróquias, dioceses e regionais, muitas vezes necessitadas de apoios humanos e financeiros. Eram os religiosos/as servindo uma Igreja que ia além das “nossas obras”. Daí o escândalo e a covardia.
2. CAMPANHA CONTRA O EXTERMÍNIO
Os 30 anos do IPJ, com sede, primeiramente, em Porto Alegre e, depois, no bairro Niterói, em Canoas, vão ser festejados com um triste fechar de portas, pelas mesmas Congregações que, um dia, se alegraram com o seu nascimento. Muito triste porque os 30 anos, de tantos serviços à juventude, parecem ter-se tornado uma memória que precisa ser esquecida .
Como é lastimável dar-nos conta que, enquanto se fecham as portas deste IPJ, a juventude da Igreja e, também, a juventude fora da Igreja está empenhada numa Campanha inusitada: a Campanha contra a violência e o extermínio de jovens, procurando fazer ouvir o grito A Juventude quer viver”. Em vez de procurar o encanto pela juventude e ser fiel ao carisma de trabalho com a juventude, religiosos/as decidem o extermínio de uma obra onde o coração, há 30 anos, era a juventude. Não se está fechando uma paróquia; não se está fechando um colégio; está-se fechando uma obra cuja alegria era colaborar teológica e pedagogicamente na construção do empoderamento juvenil para jovens que vinham de colégios públicos, de periferias e interiores pobres, de paróquias e dioceses necessitadas, alegrando-se e servindo-se de uma instituição mantida por religiosos/as que amavam a juventude sem esperar lucros a não ser os lucros que significam os valores de personalidades ajudadas em sua descoberta do sentido da vida. Vão dizer que a comparação com o “extermínio” é apelativa, mas perguntem ao coração da juventude que precisava disso se ela vão dizer o mesmo. Perguntem por quanto tempo tudo aquilo que significava “IPJ”, em 2006, além de não saber para onde ir, ficou na poeira dos corredores por vários meses porque era urgente que o Curso de “Design” tivesse uma moradia em Porto Alegre... Sabemos que a juventude de “nossos” colégios não precisava dessa obra; mas trata-se de uma minoria, nem sempre a mais pobre, que tem ginásio coberto, computador, colégios limpos, piscina etc. para atrair alunos, mas não sabemos se é isso que eles (os adolescentes e jovens) querem no mais profundo deles. Por isso, a desconfiança do atendimento que se dá a eles... Quantos educadores de “nossas” instituições estudam juventude? É que já sabemos tudo e basta viver o dia a dia. Por que estudos mais especializados?Não adianta de nada... Sabemos que não é esse o discurso de todos, mas ele é real. Por isso insistimos no “extermínio”. Acabar com o IPJ é uma forma de exterminar a juventude, tirando dela mais um espaço de vida, partilha e acompanhamento.
3. A PREOCUPAÇÃO TRISTE PELO ESPÓLIO
Pensando no estatelamento do IPJ a preocupação é a biblioteca, o banco de dados, a memória histórica e tantas outras coisas que o IPJ foi adquirindo nos 30 anos. A imagem que nos vem à cabeça está em João 19,23-24: Quando crucificaram Jesus, os soldados repartiram as roupas dele em quatro partes. Uma parte para cada soldado. Deixaram de lado a túnica. Era uma túnica sem costura, feita de uma peça única, de cima até embaixo. Então eles combinaram: “Não vamos repartir a túnica. Vamos tirar a sorte, para ver com quem fica”. Em nosso caso, parece que a túnica ficou com a CNBB, embora alguns “soldados” tenham demonstrado interesse por alguns objetos... Isso não significa que seja algo ruim, mas nos preocupa.
Um aspecto que faz entristecer é que o responsável pelo imóvel alugado, vendo a situação de dificuldades financeiras, não foi nem ouvido quando dizia e pedia que o IPJ ficasse ali, mesmo só pagando, como aluguel, um preço simbólico de uma coisa de nada. Não! A sorte do extermínio já estava lançada, seguida até de uma ameaça: Por favor, não fiquem pensando em lançar ao mundo a memória dos 30 anos... Atitudes desse tipo parece que expressam vergonha de tudo que se fez.
4. LONGE DA JUVENTUDE
São gestos como este do “estatelamento” que confirmam os levantamentos que existem, no momento, sobre a distância dos religiosos/as da juventude. Há alguns anos atrás, quando se viam sacerdotes, religiosos e religiosas participando das movimentações de jovens em Assembléias, em Encontros Regionais com mais de 45 mil jovens e outros eventos juvenis da Igreja, quando você entrava nos seminários e perguntava aos seminaristas e vocacionadas/os onde aprenderam a ter vontade de ser religioso/a ou padre a resposta era: no meu grupo de jovens. A juventude dos grupos de hoje que diga o que eles enxergam... Que se escutem, também, tantos jovens religiosos/as que gostariam de ser tratados/as como jovens e trabalhar com juventude, mas são levados a trabalhar numa Pastoral Vocacional que, muitas vezes, não tem nada a ver com juventude... Pode ser, até, um discurso exagerado, mas que é uma realidade é; só não aceita quem enterra a cabeça na areia para não ver. Até poderíamos atrever-nos a perguntar pelos sonhos com a juventude e pela evangelização da juventude que tiveram os responsáveis pelo IPJ nos últimos anos. Sabemos que generalizar essa afirmação é perigoso, mas sabemos que se lá estivesse um grupo preocupado, de fato, com a boa notícia para a juventude, ter-se-iam encontrado soluções para as dificuldades que não faltam em qualquer parte. Uma preocupação que surge no horizonte é que as diferentes comunidades religiosas parece que se esqueceram que são da Igreja e se estão fechando na formação de juventudes segundo os diversos carismas, sem muita preocupação com um trabalho orgânico com aquilo que são as Pastorais de Juventude. Não negamos que isso seja um direito e, até, uma obrigação. O que condena essa atitude para a frustração é deixar de lado a preocupação e a convicção que tudo isso tem sentido numa decidida inserção orgânica na vida eclesial.
CONCLUSÃO
Se quisermos sobreviver como religiosos/as e sermos, dentro e fora da Igreja, uma manifestação da profecia embutida em nosso carismas, não há outra saída do que o re-encanto pela juventude. Temos o dever de amar a juventude. Mais, até, do que encantar-nos, precisamos deixar-nos seduzir pela realidade teológica escondida na juventude como semente oculta do Verbo. É uma forma de escaparmos de uma esterilidade que perdeu a alegria da novidade.
Gostaríamos de não ficarmos somente neste discurso de indignação. Gostaríamos que estas linhas gerassem algo dentro de nós, nos inquietasse e nos incomodasse a fazer algo diferente, mas em prol de toda a juventude. Gostaríamos muito que nos consultassem sobre o novo serviço que – pelo que parece - pensa ser construído. As necessidades são muitas, mas não nos esqueçamos da juventude que
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