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quinta-feira, 9 de abril de 2015

REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL




QUANDO NÃO BASTAM DISCURSOS ...

Radicalmente contra esta redução, como muitos outros, encontro-me estonteado frente a pessoas que afirmam o contrário. Tonto porque as razões não convencem; tonto porque é cruel demais. Trabalho com adolescentes e jovens há mais de 40 anos e não entendo que uma verdadeiro/a educador/a esteja a favor de uma proposta dessas. Sinto-me estonteado, igualmente, com os meninos e meninas de 15 a 17 anos afirmarem o mesmo, vendo seus “companheiros/as” condenados por praticarem atos ilícitos, mesmo que os argumentos fiquem, na maioria das vezes, em lamentáveis mas isolados crimes chamados de hediondos.

Alguns documentos da Igreja afirmam que o jovem é “lugar teológico”, ou seja, uma das expressões do rosto de Deus. Frente a isso, como se dá o posicionamento da Igreja frente à redução da maioridade penal?

·         A resposta da Igreja Católica é um “não” decidido, mesmo que ela não saiba o que é afirmar que o jovem é uma realidade teológica ou, então, um lugar teológico. Mesmo que esta Igreja seja mais decidida quando se trata de aborto do que quando o discurso é o extermínio de jovens, ela é contra. Não só porque o adolescente  é uma realidade teológica, mas porque é uma questão de amor, de respeito e de humanidade. Só uma sociedade que não se ama, isto é, tanatófila, pode querer, como medida educativa, um presídio para adolescentes, ainda mais presídios que estamos acostumados a ver, onde – não só por casualidade - os “condenados” são negros, pobres e jovens.

Aprovar a redução da maioridade penal é tomar uma postura classista, onde o pobre não existe ou deveria ser morto. Como é que se entende que uma sociedade seja tão violenta que não compreenda que a percentagem mínima de homicídios cometidos por adolescentes mereça tal castigo? Não se nega que o/a adolescente possa cometer atos hediondos. Contudo, o que é hediondo? O que faz que pessoas corruptas, roubando o dinheiro do povo em milhões e bilhões, não estejam cometendo crimes hediondos? 

É evidente que está em jogo o paradigma que se tem, olhando o segmento adolescento-juvenil. Ou é um segmento que é visto que não tem preparo; ou um segmento que é o futuro, isto é a solução futura de todos os desafios; ou um segmento que é um problema, que só sabe o que não se deve fazer. Percentagem pequena defende o paradigma que aposta no adolescente e no jovem, ajudando-o/a a construir sua autonomia. Talvez a questão paradigmática seja bem mais simples: inventar uma lei que atinja essa meninada pobre que assalta, rouba, ameaça, faz arruaça porque se sentem agredidos por um mundo de adultos que se esqueceu que também foi adolescente.

Existe uma participação da mídia quanto à formação desta opinião ou é apenas uma desinformação quanto às medidas socioeducativas a que são submetidos adolescentes e jovens infratores?

·         Quem ensina a violência? Quem é violento: a sociedade ou os meios de comunicação? Os adolescentes são violentos porque eles querem ou porque são obrigados a sê-lo? Não se trata de uma desinformação, mas de um modo de ser. Apesar de haver muita bondade no mundo, não há dúvida que há muita violência. Há muitas formas de matar, de ferir, de humilhar, de desprezar. Mesmo que haja tido erros com relação à prática do Estatuto da Criança e do Adolescente porque somos levados a ver, no adolescente e na criança, somente seus deveres e não seus direitos? O que faz que a sociedade tenha medo do segmento juvenil, principalmente quando se trata de pobre, de negro e de periferia? Fazer perguntas é parte da reação diante de uma situação chocante. A sociedade em que vivemos, as famílias que enxergamos desaprenderam a educar. Vivemos num mundo que parece que desaprendeu a ter limites e de ensinar limites.

A função da sociedade para com a juventude está explícita tanto no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) quanto no recém-sancionado Estatuto da Juventude. Questões como assegurar saúde, alimentação, educação, esporte, profissionalização, dignidade, respeito, liberdade e convivência familiar e comunitária estão presentes em todo o texto. Qual o motivo que distancia tanto a teoria da prática? Porque, de fato, nossos adolescentes e jovens se veem privados de tantos direitos?

·         A resposta precisa ser dura: estão-nos acostumando a sermos comandados pela aparência. Nem a palavra nem a lei valem. Vivemos num mundo farisaico onde a simplicidade e a sinceridade de um Francisco provoca admiração e espanto porque é costume ver outras coisas. A distância entre o real e o ideal é muito grande. Fazem-se leis e estatutos para o inglês ver... Não há ética; há negócio. Não há moral porque só vale o que dá vantagem para meu bolso. Não se trata de idades; não se trata de conceitos; trata-se de sentimentos, de humanidades, de alteridades. Não se trata de discursos. É um debate que mexe com a sociedade, mas foge dos verdadeiros problemas. É um engodo. É verdade que a corrupção esteve e está na rua, mas também é verdade que em certos ambientes a discussão não é o que seja corrupção mas a maneira como se pode enganar mais as leis.

·         Qual o interesse do debate sobre a redução da maioridade? Todos sabem que não é a vontade de combater a violência. Todos sabem o que é ter raiva quando somos assaltados, quando somos ameaçados por um canivete ou uma arma (por vezes de aparência), quando somos roubados de coisas queridas; será que esta raiva que se experimenta, o adolescente não sente na pele vendo o que se faz com ele em muitos espaços? Não se defende olho por olho mas é muita cegueira não enxergar que os adolescentes visados pela redução são imagens da sociedade na qual vivemos.
Fazendo uma análise de conjuntura e percebendo a realidade dos presídios no país é possível pensar que aprisionar adolescentes e jovens que cometem delitos em celas seja a melhor forma de ressocialização?

·         A resposta deve ser descarada assim como é descarada a pergunta. O que se quer não é a ressocialização; o que ser quer é a morte, o extermínio. São raivas transformadas em vinganças. Claro que são possíveis regenerações ou ressocializações, mas não é em celas como se vêem. Haveria ressocialização de corruptos, ladrões de quantias que nem se contabilizam? O desafio é a educação; o desafio é a mudança, a conversão. Qual a diferença entre os ensaios de crime de adolescentes e os crimes de verdade dos adultos?

Considerando o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto da Juventude, pode-se considerar que a redução da maioridade penal como um retrocesso?

·         Na busca de soluções pode haver muitas tentativas. Os Estatutos dos quais se fala foram, para uns um avanço e para outros uma calamidade. Sempre dependemos de visões de mundo onde entra em jogo o real amadurecimento das relações, isto é, da convivência humana. A questão de paradigmas mexe com o mais profundo das posições das pessoas, onde os absolutos, os respeitos, as belezas, as personalidades, os amores, as diversidades, as honestidades, as sensibilidades, as alteridades, as visões de mundo comandam as leis e a elaboração de leis. Algo ser denominado de “retrocesso” ou “avanço” depende tudo isso e muito mais. Trata-se de responder a que? Parece que um dos grandes motivos da discussão é a diminuição da violência. Para diminuir a violência a solução não é a que se defende com uma redução da maioridade. A questão é outra, muito mais radical: uma sociedade que não seja nem pratique a violência. Ver a solução no debate da redução da maioridade penal é um enorme engodo, uma infinita mentira, um retrocesso lastimável. Não é uma solução racional; é um sentimento descontrolado que tem chance de se manifestar.

O pensamento reacionário, simplista e infeliz que afirma que “já que é bom, leva para morar com você” é muito presente no discurso de grande maioria das pessoas. Qual a intenção das instituições e pessoas, como a mídia e os políticos, quando apregoam pensamentos como este?

·         Primeiramente, é um discurso que de fato se ouve. Significa: só aceito conviver com pessoas perfeitas, completas, paradas, que não incomodam. Prefere-se que “o outro” seja sempre uma criança que não tem condições de responder e é condenada a aceitar, desarmada (talvez revoltada) os gestos de amor e de manipulação dos quais é objeto. É um egoísmo soberano que não se tem coragem de expressar, mas que é posto em prática no fundo dos armários existenciais. Certas coisas se decidem no escuro, às escondidas. É a aparência, a hipocrisia, a falsidade.

Não adianta recordar algumas conclusões sobre a redução da maioridade, isto é, que menos de 3% do total dos crimes violentos cometidos no Brasil têm adolescentes como autores; que a legislação brasileira relativa às crianças e aos adolescentes é considerada modelo pela ONU; que temos 54 países que reduziram a maioridade penal e em nenhum houve redução da violência; que reduzir a maioridade penal isenta o Estado do compromisso com a juventude. Nem adianta argumentar com um pequeno pronunciamento do Papa Francisco em abril de 2015:

·         Não descarreguemos sobre as crianças as nossas culpas [...] O que fazemos das solenes declarações dos direitos humanos e dos direitos da criança se depois punimos as crianças pelos erros dos adultos? [...]
·         Toda criança marginalizada, abandonada, que vive pelas ruas mendigando e com todo tipo de expedientes, sem escola, sem cuidados médicos, é um grito que sobe a Deus e que acusa o sistema que nós, adultos, construímos.

O que falta, em todo esse debate, é o encanto pelo/a adolescente e pelo/a jovem. Ser encantado pela juventude é amá-la, estar perto dela, ser curioso com o que sucede com ela, estudá-la, dar a vida por ela, escutá-la. É ser apaixonado por ela. Comer com ela do mesmo pão... É não ter medo dela. Em Copacabana, o Papa Francisco (2013), além de insistir no acompanhamento aos jovens, dizia: Não tenham medo de ir e levar Cristo para todos os ambientes, até as periferias existenciais,  incluindo quem parece mais distante, mais indiferente.  Estamos falando de um compromisso com a vida da juventude. O que é preciso é o encantamento com as periferias existenciais, isto é, com as periferias que necessitam de cuidado. Compromisso que passa por uma pastoral de processo, pelo cuidado com os/as jovens, pelo respeito à juventude, pelo conhecer a realidade juvenil, pelos sonhos dos jovens, pela opção de conhecer e carregar com os/as jovens suas cruzes e pelo encanto por ela.
É muito bonito, igualmente, ouvir o Papa Francisco falar aos jovens que sejam revolucionários: Eu peço que vocês sejam revolucionários, que vão contra a corrente; sim, nisto peço que se rebelem: que se rebelem contra esta cultura do provisório que, no fundo, crê que vocês não são capazes de assumir responsabilidades, que não são capazes de amar de verdade. Tenham a coragem de “ir contra a corrente”. Tenham a coragem de ser felizes! Misturam-se, nas palavras, a revolução, o ir contra a corrente, a rebeldia, a superação do provisório, o incentivo à crença na felicidade. Nas palavras dele, soube misturar alegria, compromisso, amor aos pobres, proximidade, coragem, rompimento de normas: atitudes que encantam, especialmente os jovens, porque a vocação deles/as é serem desviantes, mesmo que isso nos incomode e faça ter medo.

Quando tudo isso provoca medo ou é negado, é difícil um diálogo sobre aquilo que se ama.

sábado, 7 de fevereiro de 2015

NO RITMO DO XI ENCONTRO NACIONAL DA PASTORAL DA JUVENTUDE EM MANAUS

Uma crônica pobre,  mas de assunto bonito

Quando embarcava de volta para casa, em Goiânia, meu coração estava mexido. Não chorei mais porque as “aduanas” implicaram com meus suspensórios e eu resisti. Uma emoção forte, vindo de várias vivências, quiseram explodir em mim e chorei às escondidas. Imaginem um idoso, de quase 78 anos, chorando em público... Tinha estado em Goiás, rezando com um grupo, a mística do sabor e da resistência. Inspirados no lugar bíblico Jerusalém, caminhamos  levados pelo mistério de alguns verbos: ver e olhar, caminhar, falar, sentir e fazer. Em Goiânia fiquei hospedado com um amigo de muitos anos: Lourival Rodrigues da Silva, envolvido numa quimioterapia infernal por causa de um câncer. Por vezes estas e outras dores quase nos derrubam. Isso foi em Goiânia e Goiás onde, entre outros amigos especiais, estava o Geraldo, a Carmem e o Berg que teve o azar de torcer o pé querendo ajudar-me no carregamento de minha mala que levava um monte de coisas inúteis. Goiânia é um lugar onde se ama a juventude e um lugar em que pessoas de Igreja enxotam juventudes.

Viera de Brasília, onde tinha ido para não fazer nada com a número 1 de minha vida (Raquel) e o “sapeco” (como diz a Luana, filha de Joadir e Janete) chamado Joaquim. Em Brasília fui aluno de uma escola particular de geriatria... É que eu desejava aprender de novo a ser avô. Como disse, não fiz nada, mas consegui encontrar-me com gente de tempos passados (agora todos grandes): Adriano (cego que assou churrasco), Alsimar (além de outras coisas, criando cabras), Janete que recordou muitas coisas vividas, Sueli (a esposa de Adriano e mãe de Edu), Edgar (que pensa em casar), Ernani que é de Caxias e há séculos eu não via, Leandro o mesmo de sempre, trabalhando no Portal da ANEC e não sei quem mais, a não ser a querida Larissa que achei mais linda ainda.

Antes, eu estivera em Manaus, de 21 a 25 de janeiro, no XI encontro Nacional da Pastoral da Juventude. Fui lá de enxerido, tendo a passagem custado uma boa briguinha com meu confrade encarregado das finanças. Encontrei o pessoal todo na manhã do dia 22/1, na oração da manhã, na qual tive que falar umas poucas coisas, com tempo marcado.  Disse que não vinha para falar, mas ver a rapaziada, ver o horizonte, a utopia e a juventude como realidade teológica. Depois que voltei para casa, encontrei um papel onde anotara algumas ideias que deveria dizer, caso me dessem a palavra. Antes da viagem, eu escrevera que “eu vim para contemplar e ver”.
Queria ver se aí tinha corações grandes para abraçar o Reino, queria ver se aí tinha gente com vontade de construir comunidade e se havia coragem e lucidez para enfrentar diversos diabos: o diabo do egoísmo, do ódio ao pobre, da divisão, da manipulação, da mentira, da corrupção e outros diabos. Eu anotara também que devia dizer que o testemunho é que vale; que a galinhagem não leva à nada; que a importância do Projeto de Vida continua em pé e que não tivessem medo de amar a identidade pejoteira, de verdade, assim como a Laisa e o Luis Duarte parece que falaram.

Do que eu vi e senti do Encontro Nacional tentarei dizer pequenas coisas. O Encontro foi uma coisa linda e significativa: de embevecer  e de assustar. Direi pequenas coisas:

1.      O Encontro foi bom. Foi um verdadeiro banho de poesia, de mística, de arte, de juventudes, de adolescências, de acolhida para toda a Pastoral da Juventude do Brasil. Discutiram-se assuntos sérios, alguns de forma bem provocadora. As juventudes reunidas, vindas de todos os cantos do Brasil tomaram um banho e deram um banho em Manaus e na Igreja. Encontro bom é onde se pensa, se ri, se dança, se troca partilhas, se descobre, se aprofunda, se penetra no horizonte e na utopia. Manaus foi simbólica; o encontro das águas foi simbólico; a presença desconcertante de algumas autoridades foi simbólica; ficou claro que o serviço é mais poético que o poder.

2.      Fomos levados a viver, no XI Encontro Nacional da Pastoral da Juventude, o louco mundo do dionisíaco, com suas seduções onde, mais do que a razão, a organização, a postura de militantes dos anos oitenta, foi substituída pelo mundo da arte, da dança, da questão de gênero, do encontro erótico do encontro das águas do Solimões e do Rio Negro, da mística, da poesia, mesmo que isso significasse igualmente uma linda caminhada dos mártires. Mesmo abafada pelos prédios da burguesia, os gritos, os cantos, as reivindicações da caminhada dos mártires foram aos ares, misturadas de Pai-Nossos e Ave Marias. Dos prédios altos, quase ninguém quis ver o que acontecia lá em baixo, na rua.

3.      A coisa mais inesperada do Encontro foi o reconhecimento do trabalho pedagógico e formador da Pastoral da Juventude. Depois de tantos anos de perseguições, desprezos, ironias, proibições, negações de verba e tanta coisa, além de ouvir de um dos bispos da Comissão Episcopal de Pastoral para a Juventude que “a Pastoral da Juventude é a maior escola de formação de lideranças de Igreja no Brasil”, foi bom. Maravilhoso, contudo, foi receber uma carta da Papa Francisco dizendo que a Igreja também ama vocês e por isso lhes peço que não se deixem abater pelas coisas que possam chegar a ouvir da juventude; em todo tempo histórico se falou pejorativamente dos jovens, mas também em todo tempo foi essa mesma juventude que dava testemunho de compromisso, fidelidade e alegria. Nunca percam a esperança e a utopia, vocês são os profetas da esperança, são o presente da sociedade e da nossa amada Igreja e sobretudo são os que podem construir uma nova Civilização do amor. Joguem a vida por grandes ideais. Apostem em grandes ideais, em coisas grandes; não fomos escolhidos pelo Senhor para coisinhas pequenas, mas para coisas grandes!

Numa das plenárias ouvi coisas que nunca ouvira ter sido dito em plenária. Muita coisa se relacionava com a homoafetividade, completando o cenário que se vivia desde as mais diversas periferias até aquele local da Ponta Negra onde se realizou a celebração da abertura com cores, movimentos, sons, mantras, estribilhos, preocupações, amores e raivas que pareciam brotar do fundo das águas das juventudes.

4.      Só quem acompanhou de perto os milhares de conflitos da Pastoral da Juventude, dentro e fora da Igreja, pode imaginar o que significaram alguns pronunciamentos num Encontro Nacional. Claro que ao lado dos que vibraram e vão vibrar, há e haverá os que rangem os dentes, chegando a dizer que a carta foi forjada, que o Papa, de novo, falou demais... A alegria de algumas afirmações nos reportava para a história, quando apareciam documentos como o Marco Referencial da Pastoral da Juventude, o documento fundamental Evangelização da Juventude, Desafios e Perspectivas Pastorais ou, então, Civilização do Amor – Projeto e Missão.  Encontrões, marchas, reivindicações, bandeiras de luta, místicas de fazer as estrelas pularem de alegria, tudo estava lá. O que importa é que foram palavras confortadoras e de alento para um rebanho jovem acostumado às chicotadas, mas que sabe do esforço que faz em muitas partes.

5.      Como escrevi numa outra vez, o sabor e a resistência sempre foram os condimentos da sopa da vida. A sopa, contudo, por vezes, tem gosto de Belém, de Nazaré, de Cafarnaum, de Betânia, Samaria e dos diferentes gostos e sabores que têm os momentos que vivemos. Embora os sabores estejam em cada um dos “momentos” e de nossos “acampamentos” o sabor e a resistência mais suada, no entanto, situa-se em Jerusalém. O encontro de Manaus foi Belém, foi Cafarnaum, foi Betânia, foi Genezaré... O encontro de Manaus foi manauara. Foi reconhecimento. Se os olhos dos/as quase 800 jovens presentes brilharam, brilharam muito os olhos das dezenas de assessores/as que vinham de muitos lugares e deixaram um recado forte e juvenil ao clero de todo o Brasil. Entre outras coisas, eles dizem: Machuca o coração quando ouvimos de jovens engajados na vida das comunidades, partilhas que dão conta de revelar as barreiras criadas por presbíteros de nossa Igreja à caminhada e processo de formação na fé de nossas/os jovens. Sabendo de nossas limitações e fragilidades no acompanhamento às/aos jovens, com humildade pedimos perdão por nós e por nossos irmãos presbíteros por tantos espaços fechados dentro da Igreja.

6.      Em meio ao desencanto e ao conservadorismo de muitos tipos, o Encontro de Manaus conseguiu encantar. Bastava ver como os/as adolescentes que ajudavam na infraestrutura  pulavam de alegria. Não se negam os conflitos e as dificuldades, mas o que se via eram sorrisos, belezas, gente descobrindo que o grupo é o lugar da felicidade do jovem. Apesar das dores, dos extermínios (em Manaus foram mortos, naqueles dias ao menos dois jovens), apesar da tendência autoritária, grosseira, violenta, individualista, de desprezo pelos pobres e até pelo Brasil, Manaus conseguiu ver, nesta semana, uma juventude bonita que sabe que é mais bonita quando tem causas para se lutar por uma civilização do amor.

7.      Disseram-me que o pouco que falei em Manaus teve toada  simeônica, isto é, de Simeão, o velho do Evangelho que, quando viu Jesus, disse que podia partir em paz (Lucas 2, 29).  Sei que sou indigno da comparação, mas aceito por vir da boca de quem veio. Se os pés estão pesados, é muito bom saber que em Manaus os sonhos são leves, bonitos, misturados de águas, índios, horizontes, matas, rezas, esperanças e utopias.

Hilário Dick